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terça-feira, 3 de abril de 2012

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

As milícias no campo miram em direção aos movimentos sociais


                        Latifundiários e transnacionais contratam grupos armados para se “protegerem”

Jorge Américo,
da Reportagem




O campo de atuação das empresas de segurança privada não está restrito às cidades. É cada vez mais comum, no meio rural, a presença de grupos armados contratados por fazendeiros. Em 27 de julho de 2011, foi realizado em Curitiba (PR) o Tribunal de Júri que puniu pela primeira vez um caso de milícia privada no campo.
Os jurados consideraram Jair Firmino Borracha culpado pelo assassinato do agricultor Eduardo Anghinoni, irmão de uma das principais lideranças do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Paraná. O réu foi condenado a 15 anos de prisão. O crime ocorreu em 1999, no município de Querência do Norte (PR). As provas e os depoimentos apresentados no julgamento reforçaram a hipótese da existência de uma organização criminosa que atuava contra militantes de movimentos sociais na região.
Um caso semelhante permanece sem solução. Após uma ação articulada pela empresa NF Segurança, o trabalhador rural Valmir Mota de Oliveira, mais conhecido como Keno, foi morto por um funcionário que prestava serviços para a transnacional Syngenta. Outros cinco trabalhadores ficaram gravemente feridos. Ambos participavam do acampamento Terra Livre, em Santa Tereza do Oeste (PR), área na qual a empresa promovia experimentos ilegais de sementes de milho transgênico. Embora o crime tenha ocorrido no final de 2007, o processo se encontra na fase inicial de consulta das testemunhas.
O advogado da ONG Terra de Direitos, Fernando Priospe, demonstra preocupação com a atuação de milícias privadas na região. “Basicamente não houve alteração na situação no que diz respeito às milícias privadas. Por exemplo, a NF Segurança continua atuando na região de Cascavel clandestinamente”. A Syngenta acusa os trabalhadores rurais de serem responsáveis pelo assassinato de Keno e de um pistoleiro. O Ministério Público do Paraná, que acatou a denúncia, alega que o fato de ocupar uma propriedade rural significa assumir o risco de provocar o assassinato das próprias pessoas que ocuparam a área.

Indígenas, ditadura e escravidão
A privatização do setor de segurança tem mais implicações negativas do que se supõe, segundo o presidente do Conselho Estadual da Defesa da Pessoa Humana de São Paulo (Condepe), Ivan Seixas. “Elas [empresas de segurança], além dos serviços tradicionais, fazem arapongagem particular, espionagem eletrônica, industrial, militar, política. Isso tudo faz com que o Estado brasileiro esteja refém dessa gente”.
Nem mesmo os povos indígenas escaparam desse aparelho repressivo descrito por Ivan, que é ex-preso político da ditadura civil-militar (1964-1985). Em outubro, um grupo de homens armados – contratados por donos de construtoras – avançaram contra as comunidades instaladas no local conhecido como Santuário dos Pajés, no Setor Noroeste, em Brasília (DF). Estavam em disputa 50 hectares de terras tradicionais, onde vivem cerca de 30 pessoas das etnias tuxá, fulniô, kariri xocó e tupinambá. Na ação, foram registrados espancamentos, uso de spray de pimenta e arma de choque elétrico.
A consolidação do setor da segurança privada nos últimos anos e a exacerbação de seu poder deve-se muito à presença de militares ainda em atividade ou aposentados. A conduta repressiva contra cidadãos, de acordo com Ivan, é sintoma do autoritarismo herdado do período ditatorial. Para ele, “há uma ligação direta entre ditadura e empresas de segurança porque vários torturadores, civis e militares, são donos dessas empresas”.

Racismo
O professor de história e integrante da UNEafro-Brasil Douglas Belchior vê na escravidão as raízes dos excessos que são cometidos hoje. Para ele, as empresas de segurança não substituem as forças militares do Estado, mas atuam de forma complementar. “Os capitães do mato foram a primeira polícia da história. Eles tinham a função de correr atrás dos negros rebelados. Essa lógica se repetiu ao longo dos anos e, quando os policiais migraram para a segurança privada, levaram consigo essas práticas abomináveis. Daí a razão de os negros serem as principais vítimas da truculência, ao lado dos camponeses e indígenas.”
Para Marcelo Braga Edmundo, coordenador da Central de Movimentos Populares e do Comitê Social da Copa 2014 e dos Jogos Olímpicos, a segurança privada está tão estruturada que consegue obter vantagens de todos os lados. Isso se dá ou por meio da repressão ou por meio da extorsão. “Recentemente, isso aconteceu no Jardim Botânico [no Rio de Janeiro]. Algumas pessoas se recusaram a pagar os seguranças e de repente começou a ter assaltos na rua, o que claramente se configurou como uma forma de pressão”. Braga afirma que o processo de coação é parecido. “Estigmatizam a população mais pobre da zona oeste, dominada pela milícia, enquanto a classe média que vive nas áreas mais abastadas há muito tempo aceita a ação delas passivamente, as paga e fica por isso mesmo”.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Quer participar da Campanha Permanente contra o Uso dos Agrotóxicos e pela Vida?


1)   O que é a Campanha?

O casamento do capital financeiro com o latifúndio gerou o que chamam de "moderno" agronegócio. A lógica de exploração da terra – grandes extensões, monocultura, produção basicamente de grãos para exportação, mecanização e pagamento de baixos salários – necessita ainda de um ingrediente venenoso: mais de um bilhão de litros de agrotóxicos despejados na lavoura no Brasil, só em 2009. Isso significa que cada brasileiro consome cerca de 5,2 litros de venenos por ano, dissolvidos nos alimentos e na água contaminados.

O impacto desses produtos sobre a saúde humana, tanto de quem os maneja diretamente (trabalhadores rurais), como das comunidades e dos consumidores, é grande, inclusive com registros de inúmeros casos de problemas neurológicos, má formação fetal, câncer e até mortes.

Em 2009, o Brasil se tornou o maior consumidor do produto no mundo. O uso exagerado de agrotóxicos é o retrato do agronegócio: apesar de todo seu dito "avanço tecnológico", não conseguiu criar um modelo de produção e técnicas agrícolas que garantam a produção de alimentos saudáveis para a população.

O agronegócio expulsa os camponeses do campo, destrói a terra, enche suas grandes extensões de máquinas e venenos, paga mal seus poucos trabalhadores e para quê? Para vender commodities (basicamente soja e cana) para outros países. Correram para aprovar transgênicos – mesmo que seus potenciais danos à saúde ainda não tenham sido comprovados – querem de qualquer jeito flexibilizar o Código Florestal, para poderem desmatar mais sem ter que prestar contas por isso. Enfim, querem fazer do Brasil uma grande colônia de exploração, um quintal das transnacionais.

Por isso diversas entidades da sociedade civil brasileira, movimentos sociais, sindicatos, entidades ambientalistas e grupos de pesquisadores lançaram a "Campanha Permanente contra o Uso dos Agrotóxicos e pela Vida".

A campanha pretende abrir um debate com a população sobre os impactos dos venenos na saúde dos trabalhadores, das comunidades rurais e dos consumidores nas cidades, a contaminação dos solos e das águas e denunciar a falta de fiscalização do uso, consumo e venda de venenos agrícolas.

A campanha prevê a realização de atividades em todo o país. Cursos, seminários, Palestras, Audiências Públicas, Panfletagens, Atos de rua, etc. Diversos materiais (cartazes, panfletos, adesivos, cartilhas de formação, vídeo documentário) estão sendo produzidos. E caberá a nós o trabalho militante para expandirmos essas idéias na sociedade.


2)   Como posso receber as notícias da Campanha no DF?

Criamos um “Mailing” para envio de notícias da Campanha. Através do e-mail informamos sobre atividades da campanha e distribuímos informativos sobre o tema. Para fazer parte do “Mailing” basta nos informar sua vontade em receber informes da Campanha através docontraagrotoxicosdf@gmail.com.

Criamos também um blog da campanha no DF http://contraagrotoxicosdf.wordpress.com/. Através dele você poderá acompanhar as atividades e textos. Sugerimos colocar o endereço da página nos Favoritos. Fica mais fácil a visualização cotidiana.


3)   Como faço para ter acesso aos materiais da campanha?

Já temos em Brasília Cartazes , Adesivos e Panfletos. Se você quiser distribuí-los e/ou afixá-los em sua escola, sindicato, universidade, comunidade, associação, etc. basta entrar em contato conosco através do contraagrotoxicosdf@gmail.com e teremos prazer em combinar contigo a melhor forma de entregá-los. Todos os materiais da campanha são gratuitos.

Em breve teremos em mãos o Vídeo-Documentário da Campanha, confeccionado pelo renomado cineasta brasileiro Silvio Tendler. Parceiro em nossa luta. O vídeo é destinado à reprodução ampla e será utilizado para debates e oficinas nos mais variados locais. Caso tenha interesse em adquiri-lo entre em contato conosco, através do e-mail, e faz sua encomenda.


4)   Como posso promover um debate na minha escola, igreja, sindicato, universidade, comunidade ou associação?

Temos um cadastro de professores e militantes sociais que estudam o tema e se dispuseram a acompanhar as atividades promovidas no DF e Entorno. Assim, caso queira realizar um debate sobre Agrotóxicos e/ou Meio Ambiente na sua escola, igreja, sindicato, universidade, comunidade ou associação, etc. poderemos indicar-lhes nomes, além da ajudarmos na construção conjunta da grade. Os palestrantes não cobrarão pela palestra ministrada.


5)   Qual a próxima atividade ampliada da Campanha no DF?

No dia 07 de abril de 2011, mais de 02 mil pessoas fizeram um ato em Brasília para denunciar a responsabilidade do agronegócio pelo uso abusivo de agrotóxicos no país e por tentar impor ao Brasil um novo Código Florestal, que incentiva o desmatamento.

Como continuidade das atividades amplas da Campanha Contra o Uso de Agrotóxicos, realizaremos no mês de Agosto/Setembro no DF um Curso de Formação de Formadores. O curso terá como conteúdos: o que é o agrotóxico; conseqüências do seu uso; empresas que controlam o mercado; legislação brasileira sobre o tema; relação transgênico/agrotóxicos; tolerância residual e carência; agroecologia (produção); incremento no consumo de orgânicos e agroecológicos.

Inicialmente serão oferecidas 100 vagas. O curso é gratuito.

O curso ainda está em construção, e em breve disponibilizaremos mais informações.


As iniciativas propostas neste texto são apenas para o DF e ENTORNO. Para construir a campanha em outros estados, entrar em contato com a secretaria nacional: (11) 7181-9737 oucontraosagrotoxicos@gmail.com.

terça-feira, 29 de março de 2011

condenação de uma empresa a pagar indenização por danos morais a um trabalhador que, após retornar de licença médica

A 8a Turma do TRT-MG manteve a condenação de uma empresa a pagar indenização por danos morais a um trabalhador que, após retornar de licença médica em razão de problemas psicológicos, passou a sofrer ameaças de dispensa e insultos por parte do chefe. No entender dos julgadores, ficou claro o tratamento ameaçador e desestabilizador dirigido ao reclamante, o que atentou contra a sua dignidade e gerou o dever da empresa de indenizá-lo.
O trabalhador afirmou que foi contratado em março de 2003 para exercer a função de operador auxiliar de produção de refratários, sendo dispensado em julho de 2008. Em maio de 2006, foi afastado do trabalho, por seis meses, por problemas psicológicos causados pelo falecimento de sua filha. Quando retornou às atividades na empresa, passou a ser constantemente ameaçado de dispensa por seu supervisor, que também o ofendia, tratando-o por termos pejorativos.
Conforme observou a desembargadora Denise Alves Horta, embora o juiz de 1o Grau tenha indeferido o pedido de indenização, as declarações das testemunhas confirmaram o que foi narrado pelo trabalhador. Um de seus colegas afirmou que ele passou a ter problemas com o supervisor assim que retornou da licença. Era comum o chefe falar que era para ele prestar atenção no serviço e que estava de olho nele. Outra testemunha ouvida, além de assegurar que o supervisor chamava a atenção do empregado na frente de todos, dizendo para que ele abrisse o olho, acrescentou que isso ocorria porque o trabalhador apresentava-se triste, às vezes, até chorando no trabalho.
Para a relatora, essas declarações confirmaram que o reclamante recebia tratamento desrespeitoso por parte de seu superior hierárquico, ouvindo piadinhas e ameaças. Se ele não estava desenvolvendo as suas atividades do modo esperado, deveria ser orientado e não humilhado na frente dos outros trabalhadores. Na visão da magistrada, a questão é ainda mais grave se considerado que o empregado esteve afastado do trabalho por seis meses para o tratamento de depressão desenvolvida após a perda de uma filha. Nessa situação, é evidente que o tratamento ofensivo do supervisor causaria maior abalo emocional ao trabalhador. Por essas razões, a desembargadora deu provimento parcial ao recurso do reclamante, deferindo-lhe uma indenização no valor de R$3.000,00, no que foi acompanhada pela Turma julgadora.
(0175400-05.2009.5.03.0131 RO)

Extraído de: Portal Nacional do Direito do Trabalho

sexta-feira, 11 de março de 2011

Ofensiva do capital contra os povos indígenas e camponeses



Atualmente a maior luta em que está envolvido é contra 
a megausina de Belo Monte, no rio Xingu, paraíso 
da bio e da sociodiversidade em plena Amazônia, agora 
ameaçado por esse projeto dos tempos da ditadura 
militar que foi atualizado e desengavetado pelo 
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Desde os anos 
80, Sevá publica estudos críticos ao projeto, 
demonstrando suas falhas e inconsistências.
Na entrevista a seguir, Sevá mostra que o atual cenário de 
conflitos socioambientais tem, na realidade, uma amplitude 
global, representando um desafio para os movimentos sociais de 
todo o mundo. E adverte: “A ameaça também é muito grave quando 
os intelectuais e políticos considerados de esquerda rezam a 
cartilha do capital, repetem os mantras ideológicos do 
capitalismo, e usam o seu capital político e cultural para 
amainar as criticas e flexibilizar os que pensam de modo 
autônomo, para isolar aqueles que simplesmente continuam 
resistindo à expropriação”.
Desinformémonos – É possível perceber na atualidade uma 
ofensiva de alcance latino-americano desses projetos de 
exploração de recursos naturais em terras comunitárias 
(camponesas/ indígenas) ?
Oswaldo Sevá – Sim, é uma ofensiva com grande preferência pelas 
Américas Central e do Sul, mas que também assola várias regiões 
da África, da Ásia e da Oceania. Mas é uma ofensiva global, pois 
envolve agentes econômicos e políticos de muitos países, agentes 
que raciocinam e decidem com o “mapa mundi” aberto numa grande 
mesa ou numa grande tela digital. É uma ofensiva capitalista, e 
não podemos omitir nem esquecer esse nome, porque se trata de 
tentar superar mais uma das grandes crises estruturais do 
sistema capitalista. No caso, dizem os estudiosos como Harvey e 
Arrighi, é uma crise de super-acumulação, uma crise financeira, 
uma demonstração exuberante da famosa lei da “queda tendencial 
das taxas de lucro”.
Por isso, os alvos preferenciais da ofensiva são as 
localidades e regiões com recursos naturais considerados 
estratégicos. E aí se criam projetos de investimentos 
considerados capazes de gerar taxas de retorno altas – o que 
obviamente depende de custos econômicos e de custos sociais, e 
depende da possibilidade de concretizar, novamente o “velho” 
mecanismo da acumulação primitiva, que nunca deixou de atuar.
Os grandes oligopólios que controlam a eletricidade e os 
equipamentos elétricos, os minérios e a metalurgia, o 
agronegócio, o petróleo e o gás, a celulose e papel, estão há 
algumas décadas estudando minuciosamente as possibilidades de 
novas fontes desses materiais e energias e esquadrinhando com 
métodos sofisticados os novos territórios onde produzir tais 
mercadorias. Anunciam investimentos similares ao mesmo tempo em 
todos os lugares, por exemplo, hidrelétricas para barrar todos 
os rios ainda barráveis em muitos países, incluindo até mesmo 
alguns dos países mais antigos e mais ricos, como os europeus. 
Por exemplo, anunciam a abertura de novas minas de ferro, 
manganês, ou de níquel, cobre, zinco, cromo, mas principalmente 
minas de ouro, prata, platina e metais mais raros como o nióbio, 
em várias regiões do mundo ao mesmo tempo.
O primeiro passo para conseguir concretizar cada um desses 
investimentos – ao contrário do que muitos argumentam, não é o 
financiamento, pois de algum modo sobra capacidade de investir 
no sistema global – é a conquista dos territórios. Que em geral, 
já tem ocupantes, donos e usuários anteriores, em alguns casos, 
muito antigos, grupos humanos secularmente estabelecidos. Suas 
terras devem ser agora “liberadas” para barragens, novas minas, 
ou grandes plantios de eucaliptos ou palmeiras ou soja, e 
estradas e ferrovias que os conectem ao mercado mundial. Aí, os 
moradores e os vizinhos desses locais escolhidos pelo grande 
capital devem ser expropriados e transformados em proletários, 
uma parte deles em assalariados, que somente conseguirão 
sobreviver no mercado e para o mercado. Essa é a ofensiva.
Desinformémonos – Como classifica o grau dessa ameaça?
Sevá – É muito grave, pois o sistema capitalista sob ameaça 
retoma suas origens autoritárias, as empresas gastam cada vez 
mais com a segurança do patrimônio, dos executivos e dos homens 
de campo, empregam cada vez mais intermediários da coação sobre 
os povos, informantes que na prática fazem contra-informação, 
rastreando os movimentos legítimos e libertários, a agem por 
meio de capangas para rastrear e intimidar esses dissidentes e 
resistentes. O capital se apossa ainda mais dos postos de 
governo nas três esferas – executiva, legislativa e 
principalmente no Judiciário.
Enquanto aumentar o poderio das grandes empresas, as duras 
conquistas democráticas serão corroídas e derrubadas, restando 
para a sociedade uma intoxicação de propaganda institucional, as 
empresas se auto-vangloriando, alardeando “responsabilidade 
social”, “sustentabilidade”. As mesmas corporações que dependem 
da expropriação e da violência usam o dinheiro publico, isenções 
de impostos para exercer o mecenato, patrocinar e usufruir da 
promoção de sua imagem nas atividades culturais, esportivas, 
musicais, cinematográficas, etc.
Desinformémonos – Quais os casos mais graves, em sua avaliação?
Sevá – Considerar situações sociais mais ou menos graves 
depende muito do acesso à informação sobre o que ocorre, o que é 
dificultado pela própria ofensiva comentada, e depende, claro de 
escalas de valor ético. Acho que são mais graves os casos que em 
que as pessoas estão sendo desalojadas à força, em que os 
antigos moradores, sejam indígenas, ou afro-descendentes, ou 
simplesmente famílias rurais e até mesmo pequenos proprietários, 
são removidos contra a vontade e vão para a diáspora, para 
“reassentamentos” quase prisionais, vão para as novas favelas 
das cidades.
São muito graves os casos em que o suprimento de água da 
população, ou o “Riego” secularmente compartilhado entre 
vizinhos ficou ou vai ficar comprometido em quantidade e 
qualidade. É fatalmente o que se passa na região onde são 
abertas minas de ouro, pois a mineração e a concentração do 
metal usam muita água, secam os lençóis, contaminam o solo , o 
subsolo e destroem ou envenenam os cursos d’água, diminuindo ou 
acabando com a pesca. E são igualmente graves os casos em que 
haverá fome por que se perdeu a terra de plantio, ou a mata de 
colheita e caça, o rio onde se pesca.
Desinformémonos – Porque a insistência dos governos em realizar 
grandes projetos hidrelétricos?
Sevá – A insistência que você pergunta existe, mas não é dos 
governos, é por meio dos governos. Ou seja, é uma insistência 
que tem origem na grande dependência que tem alguns setores 
industriais em relação à eletricidade para uso em seus processos 
produtivos, é o caso do alumínio, do cobre, do níquel, dos 
metais em geral, da celulose e seus produtos, de alguns ramos da 
química, como cloro-soda. Mais do que isso, é a insistência das 
empresas desses setores em reduzir na sua planilha de custos, o 
grande peso que tem a energia elétrica, e aí vão atrás de novas 
fontes que sejam “baratas”, ou seja, nas quais os custos 
fundiários, sociais, ambientais sejam reprimidos para baixo; e, 
principalmente, vão atrás de condições propícias à celebração de 
contratos lesivos aos países “anfitriões” desses projetos. Foi o 
que ocorreu há quase trinta anos com a eletricidade de Tucuruí 
no Brasil, e que está delineado agora com a eletricidade do rio 
Madeira.
Desinformémonos – Trata-se, realmente, de “energia limpa”, como 
se costuma dizer?
Sevá – Bem, sou professor na área de Energia há mais de vinte 
anos, me formei em Engenharia Mecânica. Posso responder de modo 
simples, fundamentado apenas na ciência da Termodinâmica, que é 
um ramo importante da Física, que estuda o calor e o frio, as 
máquinas que transformam as energias naturais em trabalho útil. 
Pela Termodinâmica, a energia não se cria, não é “gerada” como 
dizem os economistas, os políticos e jornalistas desinformados. 
A energia é apenas transformada de um tipo em outro, 
sucessivamente. O montante total se conserva e em cada 
transformação uma boa parte de perde, se degrada, não podendo 
ser novamente obtido o mesmo total de trabalho útil. Por tanto, 
não existem energias “renováveis”.
De modo similar, existe a lei da conservação da massa e dos 
fluxos de massa, das vazões: tudo que entra num sistema tem que 
sair, de um modo ou de outro; se sair menos é porque se acumulou 
lá dentro, se sair mais é porque havia um estoque que foi usado.
Portanto, não há como produzir nada de forma “limpa”; toda 
operação produtiva produz resíduos sólidos, líquidos ou gasosos 
. Mesmo uma hidrelétrica construída em cima de um solo estéril 
emitirá vapor d’água por causa da insolação e da evaporação e 
gases da fermentação da matéria orgânica trazida pelo rio. Se a 
represa de uma hidrelétrica tiver vegetação na área alagada, 
produzirá muitos gases de fermentação, do apodrecimento dessa 
vegetação, inclusive o gás metano, que é um dos gases que 
desequilibra o efeito-estufa natural do planeta.
Insisto na resposta: não há nada renovável, nada limpo.
E vou além: mesmo que tecnicamente fosse possível, esses 
valores nunca nortearam o capitalismo. Se assim fosse, nunca 
teriam existido na proporção de hoje os depósitos de lixo 
urbano, o lançamento de esgoto bruto nos rios e litorais, a 
poluição do ar, a contaminação do solo com resíduos perigosos.
Desinformémonos – Quais os interesses estão, geralmente, 
ocultados aí?
Sevá – Transformar o interesse dos oligopólios e a luta deles 
pela sua permanência e crescimento em um valor geral, em 
interesses de toda a sociedade. A meta privada travestida em 
objetivo público. A não explicitação do vinculo intimo entre os 
“políticos” e os “ empresários”, entre a Política e a Economia; 
e por aí vamos nesse período histórico que mais parece uma 
“Idade Média” obscurantista: Estado fica sob o foco o tempo 
todo, e as Empresas estão “fora do alvo”… No caso brasileiro, a 
eletricidade, a mineração, a siderurgia, o petróleo, dentre 
outros, são os setores civis onde a ditadura militar continua, 
se aperfeiçoa, renova os quadros e a mentalidade dominadora, 
antidemocrática.
Desinformémonos – O discurso em favor desses empreendimentos 
(mineração/ energia/ transportes) que afetam terras de 
populações camponesas/tradicio nais em geral opõe um “interesse 
nacional” à resistência de uma “minoria que não pode prejudicar 
o desenvolvimento para uma maioria” – sem falar em recorrentes 
componentes xenófobos/conspirató rios que apelam a uma “suposta 
ameaça estrangeira”. Esse discurso se sustenta?
Sevá – Isso tem a ver com o que eu dizia. É uma tentativa 
obsessiva de dissimulação, uma espécie maligna de 
auto-desconstrução: acusar os outros de fazerem aquilo que as 
próprias corporações fazem. Numericamente são, sim, minorias que 
moram nos territórios escolhidos para os projetos de 
investimento; mas os beneficiários não são a maioria do país, e 
sim as minorias mais ricas, os grandes proprietários, o sistema 
financeiro. Porque o sistema não desconcentra com esses 
investimentos e, sim, concentra terras, patrimônios, rendas, 
tudo.
Conhecemos aqui no Brasil esse tipo de discurso maligno: é o 
discurso dos dirigentes da nossa Agência Nacional de Energia 
Elétrica, do nosso Ministério de Minas e Energia, da tropa de 
choque da “dam industry”. Ficam difundindo essa coisa de 
“investimento estruturante”, “estratégico”, falam em “segurança 
energética” – expressão que vem dos EUA, com sua dependência de 
petróleo importado. E daí preparam o terreno para uma 
desregulamentação total,para o licenciamento acelerado e 
garantido de qualquer obra, ou melhor ainda, para que se possa 
qualquer coisa sem licenciamento.
O “componente xenófobo” que você menciona, acho que é a 
hipocrisia ao extremo, uma manobra retórica inteligente a curto 
prazo, funciona para a opinião publica de tendência direitista e 
uma parte dos patriotas mesmo de esquerda. No caso da Amazônia 
brasileira, os territórios já estão sendo internacionalizados 
pelo capital e pelas Forças armadas e de inteligência dos países 
mais fortes, que tudo monitoram. E também pelos biopiratas, 
pelos compradores de terras e de florestas. Mas não se pode 
negar que atuam também ONGs e missionários de Igrejas que de 
fato, fazem o jogo das multinacionais.
Desinformémonos – Quais os cenários que se descortinam em 
relação ao quadro?
Sevá – A situação futura será mais grave onde a população está 
hoje mais desinformada, desmobilizada, manipulada por coronéis à 
moda antiga, ou então, amedrontada por um passado de repressão. 
Mas a ameaça também é muito grave quando os intelectuais e 
políticos considerados de esquerda rezam a cartilha do capital, 
repetem os mantras ideológicos do capitalismo, e usam o seu 
capital político e cultural para amainar as criticas e 
flexibilizar os que pensam de modo autônomo, para isolar aqueles 
que simplesmente continuam resistindo à expropriação.
Aí o Brasil da década de 2010 será um anti-exemplo, o Brasil 
que foi presidido durante oito anos por um ex-sindicalista, 
eleito pela esquerda, embora não tenha feito um governo de 
esquerda, um país que agora elegeu presidente – apesar de uma 
grande soma de abstenção e voto nulo e branco – a “mãe do PAC”, 
a senhora-propaganda (pois não pode ser mais uma 
garota-propaganda) da “Aceleração do Crescimento”.
É incrível o realismo da linguagem, pois nem se coloca 
mais o desenvolvimento como conceito-chave, e sim o crescimento. 
Crescer somente não basta, como se 3 ou 4 % ao ano não fosse já 
uma vitoria num mundo em crise, isso tem que ser “acelerado”. A 
idéia da aceleração é exatamente o que o sistema busca 
desesperadamente – contrariar a queda da taxa de lucro, obter 
retornos, lucros extraordinários.
Voltamos assim à primeira resposta: a ofensiva é para tentar 
desafogar o excesso de capital. Por causa da desigualdade, do 
dogma anti-distribuição, da despesa crescente do próprio ato de 
comandar e preservar privilégios, o capital encontra cada vez 
mais impossibilidade de se realizar fechando o ciclo da 
acumulação.




Entrevista com Prof. Oswaldo Sevá
Publicado em domingo, 06, fevereiro, 2011 23:21:43 por União 
- Campo, Cidade e Floresta
do site Desinformemonos

Engenheiro e doutor em geografia, o professor Oswaldo Sevá tem 
sido, nas universidades brasileiras, um dos principais aliados 
dos movimentos sociais em suas lutas contra os grandes 
projetos de “desenvolvimento”, como usinas hidrelétricas, 
minas e estradas. Trata-se de empreendimentos que ele, em seus 
cursos na Universidade de Campinas (Unicamp), chama de 
“conflitos atuais da acumulação primitiva”.

POR SPENSY PIMENTEL