sexta-feira, 30 de março de 2012

Brigada de Agitação e Propaganda Semeadores Mediações entre Teatro Político e Formação

Penso que todos os grupos verdadeiramente revolucionários devem transferir ao povo os meios de produção teatral, para que o povo os utilize, à sua maneira e a seus fins. O teatro é uma arma e é o povo quem deve manejá-la”.
Augusto Boal

A Brigada Semeadores assume um legado histórico das experiências revolucionárias de teatro desenvolvidas por Augusto Boal no Teatro de Arena de são Paulo que nesse período da história está dentro de uma conjuntura de trabalho com o Centro de Cultura Popular (CPC) e o Movimento de Cultura Popular (MCP) . Tanto Boal no Teatro de Arena quanto o CPC e o MCP tiveram uma atuação fundamental no movimento teatral revolucionário na década de 1960 e que ambos também foram interrompidos pelo golpe de 1960.

É em 2002 que o MST procura Augusto Boal com o Centro de Teatro do Oprimido do Rio de Janeiro (CTO) para fazer uma parceria. Essa parceria acontece após a criação do Coletivo de Cultura do MST e tem como objetivo formar um grupo de militantes com as técnicas do Teatro do Oprimido. A partir dessa formação com Boal e o CTO, o Coletivo Nacional de Cultura do MST cria a Brigada Nacional de Teatro Patativa do Assaré, os militantes pertencentes a Brigada Nacional se espalham pelos 23 estados onde o MST está organizado criando grupos de teatro. É nesse processo que nasce a brigada Semeadores.

Não existe uma data e um dia exato de criação da Brigada Semeadores, sim um processo constante de prática teatral e militante. São três os trabalhos que dão o ponta- pé na formação da Brigada: a mística de conquista da terra do acampamento Gabriela Monteiro (2004), “Trapulha” (2004), “Como fazendeiro sofre” (2004) . A mística de conquista da terra foi encenada no ato político no dia da mudança do acampamento Gabriela Monteiro da beira da rodovia DF-240 para dentro da terra de implementação do assentamento. Como a mística foi construída com os militantes do acampamento, é importante constatar que, boa parte dos integrantes da Brigada são do acampamento. Nessa área de implementação do assentamento existe um galpão que servia de garagem para tratores e armazém de agrotóxicos, nesse processo o galpão passa a ser espaço de ensaio das peças e reuniões, espaço físico esse que mais tarde virou um Centro de Formação e Ponto de Cultura apoiado pelo Ministério da Cultura (MINC).
 Naquela época em 2004 o grupo O avesso da máscara, de Teatro do Oprimido, promoveu uma oficina de teatro épico, convidando para ministrar a oficina o grupo paulista Teatro de Narradores, e entre os militantes do DF e do MS convidados estavam dois acampados do Gabriela Monteiro. Na oficina o grupo trabalhou com a peça O círculo de giz caucasiano, de Bertolt Brecht, e conheceu procedimentos de encenação do teatro épico.Em seguida, e influenciados por esse processo, o grupo inicia a construção da peça Trapulha.

Os militantes da Brigada estão inseridos nas instâncias formativas e organizativas do MST, pois a tarefa está vinculada à estratégia política da organização e comprometida com a formação. Cultivam a prática de trabalho coletivo em todas as áreas - produção de textos, peças, figurinos, adereços e bonecos e se organizam em equipes como articulação política, finanças e assessoria de imprensa.
 Antes de se organizarem como uma Brigada de Agitprop, funcionavam como um grupo de teatro político. Começado a perceber o potencial de intervenção da linguagem teatral na organização e formação social na medida em que as peças começaram a gerar discussões e mudanças de posições, esse já era o momento em que o MST retoma a discussão sobre Agitação e Propaganda. É nesse contexto que o grupo de teatro se transforma em uma Brigada de Agitprop para uma atuação mais ampla e estratégica política na luta de classes. Para contribuir nesse processo foi e está sendo necessário uma a retomada de experiências passadas, que foram interrompidas pelo golpe de 1964, retornar a Augusto Boal a o MCP e CPC nos faz compreender o trabalho de Agitação e Propaganda além do panfleteamento que é o que a esquerda brasileira tem assumido após o fim da Ditadura Militar.
 Um outro aspecto que dá base na ampliação do caráter de Grupo de Teatro Político para uma Brigada de Agitação e Propaganda são os trabalhos de Agitprop realizados no DF e em Goiás na véspera da Marcha Nacional pela Reforma Agrária e por Justiça Social (2005). Apresentaram as peças "A luta do camponês contra o agronegócio" e A "bundade do patrão"; e participamos dos debates sobre Reforma Agrária promovidos após as peças nas comunidades da periferia urbana. Também participaram do processo coletivo de construção do teatro procissão com 270 atores, com o tema "A história do Brasil pelo ponto de vista do camponês", apresentada no gramado do Congresso Nacional, em 17 de maio de 2005 - data da chegada da marcha em Brasília.

A Práxis na Formação de Militantes Agitadores Propagandistas

“São constantes os depoimentos de participantes de oficinas que alegam que os exercícios trabalhados, as discussões e as peças montadas funcionam como um processo de formação política e conhecimento pessoal. Há, portanto, uma ressonância do trabalho teatral na esfera da vida cotidiana, o que corrobora com a tese de que num processo revolucionário a arte deva se diluir na vida”.  (Villas Bôas, 2003: 26)
 O processo de formação que a Brigada assumiu vai desde o momento do estudo sobre determinado tema para a construção coletiva das místicas, peças e intervenções, esse processo conta com seminários, oficinas, cursos de formação política na área da cultura e cursos formais. Esse processo de formação não se restringe apenas ao estudo teórico, pois se extende para as intervenções práticas. A cada intervenção surge novas possibilidades, a cada trabalho apresentado é feita uma avaliação em conjunto com as referências teóricas. Não se separa a teoria da prática, assim internalizando a Práxis nesse processo. Além da teoria e prática revolucionária teatral cada integrante da brigada participa organicamente de cada setor e assumem uma tarefa em determinadas instâncias da vida orgânica do MST e a participação nas marchas, ocupações e em diversas formas de luta do Movimento. Esse conjunto de atividades presente no cotidiano da vida da Brigada proporciona uma constante prática nas possibilidades de intervenções política e contribui para um método de formação de agitadores,atores e militantes políticos.
 Pode perceber plenamente o avanço na formação política dos integrantes da Brigada, a prática de estudo, pesquisa e implementação das intervenções ao longo desses anos de trabalho coletivo teve um papel fundamental desse processo. As questões chaves que fazem conexão nesse caminho de avanço na formação política são o estudo,pesquisa, construção coletiva e a prática militante. Por terem essas questões chave na formação a Brigada cumpre a risca uma decisão política definida coletivamente, que é do estudo. Os militantes sempre estão fazendo os cursos organizados pelo MST, uns no Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária( ITERRA) no RS outros, em cursos e seminários de formação Política organizados pela Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF) e nas Universidades.
 Nesse processo de formação é interessante trazer presente um curso realizado no Pré Assentamento Gabriela Monteiro. Aquele galpão que antes servia de garagem para máquinas agrícolas e armazém para Agrotóxicos virara um Ponto de Cultura apoiado pelo Ministério da Cultura (MINC). As atividades a serem realizadas ali eram oficinas de formação cultural, essas simples oficinas se transformaram em um curso.
 O curso de Arte, Comunicação, Cultura e Agitação e Propaganda na Formação, planejado em um encontro seminário de cultura do MST acontecido na Escola Nacional Florestan Fernandes em julho de 2005, encontro esse que foi fundamental na reflexão de legados históricos para a formação de militantes Agitadores e que teve sua contribuição na construção desse curso. O curso foi dividido em cinco etapas, Foi adotado a metodologia da Pedagogia da Alternância baseada em Paulo Freire,e que é o mesmo método pedagógico adotado pelo (ITERRA), o curso foi dividido em cinco etapas cada etapa foi dividida entre Tempo escola e Tempo comunidade. No Tempo escola o participante estava no Ponto de Cultura, pela manhã aconteciam leituras e debates teóricos e pela tarde oficinas nas áreas de teatro,música,artes plásticas e comunicação. Esse curso foi de grande valia para o acumulo teórico e prático com produções culturais construídas coletivamente pelos militantes participantes, tem como produto não final e sim em construção em todo um acúmulo de intervenção Política Cultural que a Brigada Semeadores tem adquirido nesses anos de trabalho. É de fundamental importância ressaltar que boa parte dos integrantes da Brigada Semeadores integrou a equipe de Coordenação Política e Pedagógica (CPP) desse curso, a participação desses militantes em outros processos de formação na (ENFF) e no (ITERRA) foram importante para contribuição na (CPP) desse curso, isso por conhecerem a prática do método pedagógico de formação do MST.

Repertório de peças de autoria coletiva da brigada:

Trapulha (junho de 2004). Peça que aborda criticamente as relações de poder, estabelecendo conexões entre a perspectiva local e mundial, com procedimentos do teatro épico, construída coletivamente após oficina com Teatro de Narradores (SP) em que cenas da peça O círculo de giz caucasiano, de Bertolt Brecht foram trabalhadas em experimentos.
 Como fazendeiro sofre! (dezembro de 2004). Peça de teatro épico elaborada a partir de adaptação da peça Exploração do Trabalho, da Brigada Estadual de Cultura Filhos da Terra, do MST/MS. A proposta é explicitar o cinismo dos argumentos de legitimidade social dos latifundiários brasileiros, por meio de uma estrutura que permite a indagação à contrapelo de determinadas premissas da narrativa conservadora sobre a história oficial brasileira e, em específico, da questão agrária.
 Contraponto (2005). Peça de agitação e propaganda, com procedimentos de teatro épico, que visa estabelecer uma crítica da construção ao padrão hegemônico de representação estética da realidade, mostrando as condicionantes históricas do conflito agrário brasileiro, e a ação de resistência e enfrentamento das pessoas que optaram pela condição de engajamento ao se inserirem no MST e o preconceito disseminado contra os movimentos sociais de massa pela grande imprensa brasileira.
 Boicotar a ordem! (janeiro de 2006). Intervenção de agitprop construída para ser utilizada diante do aumento arbitrário do preço da passagem dos transportes coletivos no DF.
 Intervenção de agitprop Eldorado dos Carajás. (03/2006). Intervenção de agitprop construída em oficina ministrada pela Brigada Semeadores em etapa do curso estadual de formação em cultura, comunicação e agitação e propaganda, com o intuito de explicitar, por meio da ironia, a dinâmica da violência que estrutura o latifúndio brasileiro, em conluio com o poder judiciário.
 Roteiro para mística do ato de solidariedade à Cuba (09/11/2006). Intervenção realizada na UnB em parceria com outras organizações e entidades de esquerda, como forma de pressão política para libertação dos cinco militantes cubanos presos injustamente nos EUA.
 Intervenção de agitprop Cabo de guerra da esquerda contra a direita. (2006). Intervenção montada durante o 2º turno da eleição presidencial de 2005, como parte da tática de mobilização do MST contra o risco de vitória eleitoral da direita, com Geraldo Alckmin. A peça utiliza o recurso clássico de agitprop, da luta e box,para estabelecer uma comparação entre os feitos dos oito anos de governo de Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, e os feitos do quatro anos do governo Lula, em algumas áreas estratégicas, como investimento em programas sociais, dívida com Fundo Monetário Internacional, atuação da Polícia Federal em crimes por corrupção, etc.
 Mística/intervenção de agitprop da na sessão solene em homenagem ao dia de luta pela Reforma Agrária, na Câmara Legislativa do DF. (2007). Estrutura de intervenção que mescla ação de teatro invisível com trechos de outras intervenções já elaboradas pela Brigada.
Jogos de agitação e propaganda: Pega a terra. Intervenções de agitprop criadas por meio de adaptações de jogos infantis, para serem jogadas na rua por integrantes da brigada e por pessoas que estiverem passando pelo local em que a intervenção ocorrer.
 Projeto América Latina. Pesquisa sobre a luta de classes na América Latina, por momentos históricos decisivos, que nos permitam a visão de conjunto do processo de dominação em suas distintas fases (colonialista, imperialista, neoliberal, ...).A pesquisa ocorrerá por meio de um processo cumulativo de intervenções que se desenvolverão ao longo de dois anos, até 2009, período de homenagem e comemoração aos 50 anos da Revolução Cubana.A fase 1 da pesquisa tem como tema a reflexão sobre os 40 anos da morte de Che Guevara, que inclui o desdobramento dos processos revolucionários na América Latina, e a análise do processo de transformação da imagem de Che Guevara em mercadoria.
 Intervenção no Ato do Trabalho Escravo. Movimento em apoio pela Aprovação da PEC 438 e Erradicação do Trabalho Escravo no Congresso Nacional. O objetivo foi de realizar uma ação de teatro invisível no espaço da mística de abertura do ato, para pautar a relação entre trabalho escravo e agronegócio, e criticar a ação da bancada ruralista, de protelar as votações de interesse da reforma agrária.
 Nesse repertório pode observar a variedade e temas e técnicas que a Brigada tem construído ao longo dos anos de trabalho, essa variedade de temas vem a partir do contexto de luta que o MST está inserido, são temas que servem para debates em cursos de formação, encontros e nas lutas conjunturais. Já as técnicas são baseadas em teatro político, intervenções de Agitprop tanto em grandes públicos nas ruas e mobilizações , quanto a serem apresentadas em espaços fechados como auditórios, o teatro épico tem sua valia em espaços internos de formação do MST, Sindicatos e escolas que preparam para o debate, e as místicas que estão presente em todos os espaços. A prática militante da Brigada em conjunto com a construção desse repertório vem reafirmar na prática o debate do “artista militante e militante artista”. 


Algumas Reflexões Orgânicas

A Brigada Semeadores participa da vida cultural e política do MST/DFE e, em geral, das atividades do calendário político da esquerda brasileira na capital federal do país, apresentando suas peças teatrais em espaços de formação política, fazendo intervenções de Agitprop em períodos de jornadas de lutas prolongadas, ministrando oficinas para formação de novos agitadores, e se integrando permanentemente nas equipes de mística dos grandes eventos realizados em Brasília, como a Conferência Nacional da Água e da Terra (2004) e a Assembléia Popular Nacional (2005). Essas entre outras atividades garantem com que a Brigada está inserida contribui paras as estratégias que o MST tem adotado como prioridade que são a Formação, Produção, Frente de Massas e a Relação com Sociedade que são decisivas na construção do avanço na luta pela terra no Brasil e que o Movimento tem como lema do seu mais recente congresso nacional Reforma Agrária: por Justiça Social e Soberania Popular.
A luta de classe no Brasil vive uma conjuntura acirrada, o sistema Capitalista está moderno, o judiciário com todo o aparato do Estado vai para o embate com a organização da classe trabalhadora. No campo da Questão Agrária a elite burguesa dominante está organizada no Congresso Nacional assim fazendo a CPI para investigar o MST e que mais tarde todos os Movimentos Sociais. É nessa conjuntura que podemos observar de forma mais clara a importância que a Brigada tem nesse processo, de trabalhos com MST de temas dessa conjuntura que vão para o embate contra esse Sistema Capitalista. Outro papel fundamental nesse processo é de trazer para a prática uma herança de Agitação Política que foi interrompida na década de 1960, e que a esquerda brasileira negou por décadas após a Ditadura Militar.
 É necessário colocar os pés no chão, avaliar as lutas passadas, as presentes e como que está sendo a prática cotidiana, para que possa planejar o futuro a partir da luta presente, assim bebendo em fontes teóricas. A conjuntura está intensa, a luta dos pobres acirrada, então os trabalhos também tem que ser constantes. A Brigada Semeadores tem passado por limites na continuação de seu trabalho para que garanta a prática dessa herança histórica, os encontros da brigada tem ocorrido com intervalos muito longos um do outro e a falta de recursos financeiros é um limite a ser superado.
 A parceria a ser realizada na área de formação com o Grupo Teatro de Narradores de São Paulo é bastante importante para essa estratégia. Pois a preparação para essa parceria exige um processo de leitura de textos e debates que irá proporcionar um melhor avanço nessa parceria. Apenas essa parceria não é u suficiente a Brigada tem que ir além, é necessário uma massificação desse trabalho nos municípios do entorno do DF onde o MST está organizado em Assentamentos e em Acampamentos e que acontece uma luta política naquela região. Pois em uma linha mais estratégica o a Brigada Semeadores assume um Papel de mais permanência na Capital Federal Brasília e nas cidades do próprio DF.

Por Janderson Barros.

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